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sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Guia SeElaCorreEuCorro de Sobrevivência em Trail Running

Considerando a quantidade de gente experimentando correr fora do asfalto nos últimos tempos, e pensando também nos meus amigos que pretendem debutar nesse campo nos próximos meses, pensei em escrever aqui algumas dicas e observações para evitar que eles cometam alguns equívocos ou deixem de aproveitar tudo o que a corrida em meio à natureza tem a oferecer.

Encarem isso como um bate papo despretensioso, afinal, quem sou para querer ditar regras e verdades absolutas, ou dar dicas de expert? Sou um amador, como vocês.

Então, aí estão algumas convenções sociais e regras de convivência que tenho observado ao longo desses anos correndo em trilhas e montanhas:


Trail Running for Dummies - e uma referência para nós rs
- Sempre que possível, utilize calçado adequado para a prática de corrida fora do asfalto, pelos motivos que elenquei em um texto anterior (resumo: proteção e tração);

- Dê passagem. É muito comum encontrar pessoas que acabaram de sair do asfalto (onde você corre sozinho apesar de cercado por milhares de pessoas) e ainda não perceberam que no meio da trilha não é a filosofia do cada um por si que reina, mas a solidariedade. O espaço é curto e há obstáculos por todos os lados, se a pessoa que vem atrás de você tem um rendimento melhor, abra um espaço quando conseguir e deixe-a passar. Não vai ser essa pausa de 1,2s que vai mudar seu tempo final.
Não seja um "empata-fila"! Surgindo uma oportunidade, dê passagem!
Ainda no assunto do "dê passagem", evite utilizar fones de ouvido, ou, caso uma musiquinha seja essencial pra você na corrida, tente utilizar em um só ouvido e em volume baixo. Você deve ser capaz de ouvir os passos de outro corredor vindo atrás de você na trilha (pense na trilha como um corredor de motoboys entre os carros, mas ao invés de buzinar e chutar seu retrovisor, o corredor que vem atrás vai fazer barulho no mato, depois vai começar a pisar duro, tossir, fungar no seu cangote e eventualmente gritar "pista! prestenção ôh"). Além disso, é importante ficar esperto nos avisos de quem está à sua frente (cuidado com o buraco aqui! olha a pedra solta! se liga no cipó! ONÇAAAAAA!!!!). Enfim, a música alta vai tirar sua atenção de detalhes importantes e pode prejudicar você e os demais.

Não. 
- (Update Julho 2017). Ainda no assunto "música", com a popularização das caixinhas de som com conexão por bluetooth surgiu a necessidade de editar esse texto para incluir o seguinte conselho: não seja o DJ Trilheiro! Tirando você, o dollynho, e mais um ou outro amigo seu, 99,97% da turma que está na trilha não quer ouvir as suas músicas. De fato, a grande maioria está no mato justamente para curtir a paz, o silêncio e os sons da natureza. Não obrigue os demais a ouvirem Raça Negra, MC Quaquécoisa ou Slayer só porque esse é o tipo de música que você mais gosta.

Tuts-tuts-tu-tu-tuts

Não seja essa pessoa
- Pode conversar. Depois de correr 40 minutos sem encontrar viva alma no caminho, quando você finalmente encontra alguém e essa pessoa corre num ritmo parecido com o seu, troque uma ideia! (rs) Vale qualquer coisa, até mesmo aqueles assuntos de elevador (quente, hein? daqui a pouco chove... você também correu aquela prova x?). Além de ajudar a distrair a mente enquanto encara aquele paredão interminável, você ainda pode fazer novas amizades! Win-win situation! rs
Conversando um pouco pra esquecer a dor no joelho

- Solidariedade. Sempre. Seja cedendo a passagem, seja ajudando alguém a pular uma vala ou escalar uma pedra, seja perguntando se a pessoa está bem, ou oferecendo água/gel pra alguém que está passando mal, dando apoio para alguém que acabou de se estabacar à sua frente... acredite, quando você estiver exausto, no meio do mato, uma palavra amiga e um gesto de solidariedade valem ouro.

- Não deixe vestígios. Você não está correndo ali no meio do mato porque acha bela e imponente a natureza? Então deixe-a como você a encontrou. Eu fico f#dido quando vejo gente jogando a embalagem do gel pelo caminho (e tem gente que guarda o sachê, mas joga a "tampinha" na trilha). P#%r@! O que é que custa deixar essa embalagem no bolso da sua roupa, criatura? Ocupa espaço? Qual é, né, um pouco de tato, galera!

- Não tenha medo de se sujar ou molhar o pé. Se está com nojinho, nem vá! (rs) Admita desde o começo que todo e qualquer perrengue que surja no caminho faz parte da experiência e será mais uma história pra contar para os amigos mais tarde. Claro que existem casos e casos mas, de uma forma geral, pise nas poças, salte sobre os troncos, esquie no esterco, rompa as teias de aranha com a cara e continue sentando a bota! Nada pior do que você estar na vula atrás de alguém no single track e a pessoa dar uma freada brusca para não molhar o pé numa nascente...restando ainda 1km de prova dentro de um rio!!! rsrs

Cris mostrando como se faz!
- Já que o assunto é onde colocar o pé, olhe por onde pisa (foco adiante)! A própria essência do trail running é correr em terreno irregular. Em 100m de percurso você pode passar por cascalho, erosões, asfalto esburacado, barro escorregadio e sei lá mais o quê. Então planeje antes onde seu pé vai pousar. Corra olhando alguns passos à frente e já vá calculando onde pisar. Isso pode evitar alguns tombos e torções.

- Importante pra quem acaba de sair do asfalto: deixe o pace sub-qualquer-coisa em casa. É o percurso que determina o seu ritmo, não o seu RP nos 10km no asfalto. Você VAI ter que parar pra andar em alguma parte do percurso, então ande sem culpa. No asfalto as pessoas podem te olhar torto se você parar pra caminhar por alguns segundos. No trail a regra é outra: corra quando conseguir, ande ou rasteje pelo resto do tempo! O importante é chegar ao destino! rs

(UPDATE Dez.2015) - depois de me perder algumas vezes, achei interessante voltar aqui no texto para dar esse aviso que é útil mesmo para os "macaco-véio" . Mantenha o olho nas marcações do percurso SEMPRE. Às vezes a gente se distrai apreciando a paisagem ou prestando atenção apenas nos competidores à nossa frente e, quando vai ver, lá está mais um garoto perdido! rs
Caso venha a se perder, sem stress! Volte os passos até encontrar uma marcação e então continue o caminho (não vai cair na burrada de seguir em frente e tentar adivinhar onde está a trilha!).

(UPDATE Dez.2015) - Sempre que possível, procure ser autossuficiente nas provas. Evite contar com a água e comida disponibilizadas pela organização. Imprevistos acontecem (às vezes com tanta frequência que deixam de ser imprevistos) e há uma grande chance de você encontrar um posto de apoio desabastecido. Além disso, ainda que o mapa do percurso diga que haverá um posto de apoio a cada 3km, você nunca sabe dizer quanto tempo levará para cobrir essa distância (dependendo do terreno e inclinação, 1km pode levar mais de 20 minutos para ser superado). O mesmo vale para treinos em locais remotos. Deixar de carregar água e comida pode colocar em risco não só você, mas todo o grupo (que terá de carregar seu corpo inerte trilha afora). Então carregue uma handheld, vista uma pochete ou coloque uma mochila e seja feliz!

"Já posso correr, Gabriel?"
(UPDATE Dez.2015) - Com base em excelentes sugestões deixadas nos comentários, volto aqui para deixar mais uma dica: estejam preparados e protegidos! Preparados para quê? Para tudo! rs
Eu sou suspeito para falar, já que sofro da Síndrome de Inspetor Bugiganga, mas é interessante contar com proteção contra o sol (boné/buff/protetor solar), proteção para os olhos (quantas vezes já não levei galhada na cara e fui salvo pelos óculos escuros!), para as mãos (luvas caem muito bem quando você precisa usar cordas para descer um barranco rapidamente e também protegem de galhos com espinhos), kit de primeiros socorros, e por aí vai. Cada tipo de prova/treino irá determinar o tipo de proteção mais urgente.


Exageros à parte, é melhor ter e não precisar usar do que precisar e não ter (tipo seguro de carro! rs) -  by The Oatmeal
- E aí entra a questão de estar preparado: ao escolher uma prova, procure se informar sobre as edições anteriores, veja o tempo de conclusão dos participantes daquela edição, leia relatos sobre aquela prova para ver quais pontos são os mais sensíveis e difíceis e avalie quais serão as medidas que você deverá tomar para superar essas dificuldades.

Tenha em mente que na imensa maioria das provas em trilha desistir não é uma opção. Você pode até desistir de competir, mas ainda assim será forçado a concluir a distância, já que não tem como chamar um táxi/uber ou pegar um busão do topo da montanha até a linha de chegada. Saber isso e estar preparado física e psicologicamente para essas situações é o que determina se você irá se divertir ou achar a experiência um porre.

- Acima de tudo, DIVIRTA-SE! Já que você está pagando voluntariamente por esse sofrimento saudável, o mínimo que você pode fazer é se divertir!

De cabeça, acho que as principais dicas são essas. Sinta-se à vontade para acrescentar novas regras e dicas nos comentários! Isso aqui é um bate papo!


A gente se tromba nas trilhas! ;-)

9 comentários:

Magaly disse...

Muito interessante as dicas passadas, e que bonito ler e sentir a preocupação de dados, a solidariedade, parabéns por mais essa atitude também. Continuo adorando ler, saber o quão gratificante está sendo para vocês.
Desejando sempre bom desempenho e toda proteção de nosso pai maior.
Fã de carteirinha...mommy****

Gabriel C. disse...

Obrigado! ;-)
Acredito que dicas são sempre úteis - mesmo se as dicas não prestarem, elas servem pra estimular a pessoa a pensar em outro caminho! rsrs.

Unknown disse...

adorei as dicas, obrigada por deixar o post no @tenisesainha... vou tentar colocá-las em prática no domingo na Trail Run de Juscimeira/MT. até mais!

Gabriel C. disse...

Que bom que gostou, Célia!
E depois que você correr essa prova, sinta-se à vontade para voltar aqui e acrescentar qualquer dica que achar pertinente!
Boa prova!

Unknown disse...

ótimos pontos! Principalmente o da solidariedade. Já me ajudaram com alongamento por conta de caibras no meio da trilha, tento retribuir sempre que preciso. E outra coisa que ajuda muito também. PROTETOR SOLAR e proteção na cabeça. Perdi a conta de quantas vezes vi gente passando mal de insolação nas provas. Abcs e paragens pelo Blog!

Unknown disse...

Cara, parabéns pelo Blog, especialmente por esta postagem com ótimas dicas! Se me permite, gostaria de acrescentar mais uma: depois de ter corrido a KTR este ano (onde conheci seu blog através de amigos) sugiro que, na medida do possível, se informe sobre as dificuldades do percurso! 25km la viravam tranquilamente 8,9 e até 10h de prova! Quem corre na rua, não acredita que um percurso que vc faz em 2,5-3h possa demorar tanto assim e menosprezar as dificuldades. E outra, la no meio da trilha, não da para desistir da prova, quebrar e pegar o ônibus para voltar para a largada! Abs

Gabriel C. disse...

Obrigado pela leitura e pelas excelentes dicas, Rafael e Fernando!
Já até editei o texto para incluí-las! Informação nunca é demais. E quanto mais informados os corredores estiverem, menores as chances de surgir um imprevisto que possa tirar a diversão da experiência!
Abraços

Unknown disse...

Acrescento uma observação pertinente, não uma dica. Exitem vários tipos de provas de "trilha", algumas nem tem trilhas. Nem sei bem que nome se dá a estes diferentes percursos. Temos Corrida de Montanha, Corrida Rústica, corridas em estrada de terra, corrida de praia, etc.... e tem corrida com isso tudo junto. Tem até corrida de "montanha" no asfalto (Pico do Jaraguá ou caminho do mar). E é essa diversidade que é legal, sempre somos surpreendidos !!

Gabriel C. disse...

Ótima observação!
A diversidade é excelente, afinal, tem gosto pra tudo. Tem quem goste de estradão e tem que deteste. Tem que goste de trilhas técnicas e tem quem não suporta. Particularmente, só não gosto de ser surpreendido... se o nome da prova é Ultra Trail BlaBlaBla, o mínimo que se espera é que tenha efetivamente uma boa porção de trilhas. Assim como quem se inscreve para correr no asfalto no Pico do Jaraguá não ficaria contente se na última hora o percurso incluísse a trilha do Pai Zé! rs
Aí vai muito além de preferências pessoais, pois também diz respeito ao treino específico e ao tipo de equipamento a ser utilizado, por exemplo.

Ao mesmo tempo, a própria definição de trilha não é unânime, né? Por exemplo, se dá pra você passar de carro 1.0 no local sem suar, eu não chamaria de trilha. Mas tem gente que chama de trilha só porque não é asfaltado. Quem está certo e quem está errado? rs ¯\_(ツ)_/¯